quinta-feira, 2 de junho de 2016

Pretérito perfeito


Gratas lembranças, como são boas. Tudo já passou, não há surpresas ou riscos, o filme é conhecido, assim como seu desfecho. Ao passar dos anos esses pedaços de existência vão se tornando cada vez mais valiosos. Mas um aviso aos viajantes do tempo: não cruze a fronteira muitas vezes. Se o fizer, as coisas poderão ficar um tanto confusas e complicadas. Muitos vivem além da fronteira, encontraram refúgio e acima de tudo, pretextos confortáveis para todas as tempestades e amarguras do hoje.

Preso em memórias douradas, o presente, o por vir, começam a ser irrelevantes e um sentimento se fortalece, ganha voz e diz que as melhores partes da jornada já foram concluídas. Uma percepção tremendamente errada e danosa, porém é compreensível. Existir é sofrer, o assustador desconhecido se alonga a nossa frente, conflitos internos e externos, o caos do ser impera. Diante desse mar de descontroles, os filmes antigos de nossa trajetória se tornam um farol na noite, em meio as águas revoltas de uma imensidão, um abrigo seguro. Dias passam, rotinas seguem e encontros com antigos conhecidos se tornam raros e quando ocorrem servem somente para relembrar momentos áureos. Permanecendo assim só nos restam mágoas, arrependimentos, falsas justificativas e por fim: o apagar das luzes.

O passado é muito precioso é uma vasta biblioteca que possui incontáveis ensinamentos inestimáveis e também é lar de estrelas que já não existem, unicamente o seu brilho ainda chega até nós. Que ele ilumine nossos caminhos, que nos de força e coragem e não ofusque os ciclos vindouros. Apesar de todas as agruras do nosso tempo, existem ocasiões onde nos encaixamos perfeitamente no universo e tudo vale a pena. São lampejos, podem ser relativamente curtos, contudo irradiam uma poderosa luz, como um sol particular. Não são necessariamente grandes acontecimentos, pode ser uma manhã de sábado, onde não há nada especial, apenas o jeito como uma brisa fria adentra a janela e toca sua face enquanto você observa o mundo lá fora. Em um instante tudo parece diferente, tudo fica mais nítido e um horizonte de possibilidades se descortina diante de seus olhos. É engraçado como permeamos entre camadas sensíveis de grandes opostos, em um segundo temos a compreensão do universo nas mãos, no seguinte estamos nos afogando em agonia.

Assim segue a inexorável marcha dos vivos até o seu momento derradeiro. Tolos mortais é o que somos, muitas vezes esquecemos que nossos melhores momentos foram proporcionados porque possuíamos o tempo presente em mãos, assim como agora.

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